São relativamente comuns relatos de pessoas que ficaram “de fora” do mundo por décadas: condenados que recobram a liberdade e têm que se entender com a internet e os smartphones, organismos tenazes que acordam de anos e anos de coma e emergem em realidades futuristas. Mas se na ficção distópica eles quase sempre se veem em apuros, quero crer que será empolgante acordar numa época em que o trabalho remoto é uma alternativa e as contas podem ser pagas de casa. A partir da adolescência, quando me mudei para longe do oceano, o mar tem sido objeto de uma evidente obsessão: preenchi páginas de diários, crônicas e ficção com digressões sobre todos os aspectos relacionados a estar perto do Atlântico: vistas, cores e resplandecências; o cheiro úmido e salgado da maresia; o marulho hipnótico; os ciclos caprichosos das marés; os humores dos ventos e os seus efeitos sobre a textura da água e o comportamento da ondulação; o atrito incessante da movimentação de ar nas orelhas: está tudo lá, debulhad...
(textos esparsos de R. Coelho)